Manuel Bandeira

No mil frases.com, você terá a oportunidade de explorar uma seleção cuidadosamente curada dos poemas de Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho, permitindo que sua mente se perca nas sutilezas das palavras e suas interpretações cativantes. Sinta-se convidado a descobrir a profundidade de sua poesia e a riqueza de suas contribuições para a cultura literária brasileira.

Uma imagem com a seguinte frase I

A sala em espelhos brilha

Com lustres de dez mil velas.

Miríades de rodelas

Multicores — maravilha! —


Torvelinham no ar que alaga

O cloretilo e se toma

Daquele mesclado aroma

De carnes e de bisnaga.


E rodam mais que confete,

Em farândolas quebradas,

Cabeças desassisadas

Por Colombina ou Pierrette.

II

Pierrot entra em salto súbito.

Upa! Que força o levanta?

E enquanto a turba se espanta,

Ei-lo se roja em decúbito.


A tez, antes melancólica,

Brilha. A cara careteia.

Canta. Toca. E com tal veia,

Com tanta paixão diabólica,


Tanta, que se lhe ensangúentam

Os dedos. Fibra por fibra,

Toda a sua essência vibra

Nas cordas que se arrebentam.

III

Seu alaúde de plátano

Milagre é que não se quebre.

E a sua fronte arde em febre,

— Ai dele! e os cuidados matam-no.


Ai dele! que essa alegria,

Aquelas canções, aquele

Surto não é mais, ai dele!

Do que uma imensa ironia.


Fazendo à cantiga louca

Dolorido contracanto,

Por dentro borbulha o pranto

Como outra voz de outra boca:

IV

— "Negaste a pele macia

"À minha linda paixão!

"E irás entregá-la um dia

"Aos feios vermes do chão...


"Fiz por ver se te podia

"Amolecer — e não pude!

"Em vão pela noite fria

"Devasto o meu alaúde...


"Minha paz, minha alegria,

"Minha coragem, roubaste-mas...

"E hoje a minh'alma sombria

"E como um poço de lástimas..."

V

Corre após a amada esquiva.

Procura o precário ensejo

De matar o seu desejo

Numa carícia furtiva.


E encontrando-o Colombina,

Se lhe dá, lesta, à socapa,

Em vez de beijo uma tapa,

O pobre rosto ilumina-se-lhe!...


Ele que estava de rastros,

Pula, e tão alto se eleva,

Como se fosse na treva

Romper a esfera dos astros!...

Manuel Bandeira

I A sala em espelhos brilha Com lustres de dez mil velas. Miríades de rodelas Multicores — maravilha! — Torvelinham no ar que alaga O cloretilo e se toma Daquele mesclado aroma De carnes e de bisnaga. E rodam mais que confete, Em farândolas quebradas, Cabeças desassisadas Por Colombina ou Pierrette. II Pierrot entra em salto súbito. Upa! Que força o levanta? E enquanto a turba se espanta, Ei-lo se roja em decúbito. A tez, antes melancólica, Brilha. A cara careteia. Canta. Toca. E com tal veia, Com tanta paixão diabólica, Tanta, que se lhe ensangúentam Os dedos. Fibra por fibra, Toda a sua essência vibra Nas cordas que se arrebentam. III Seu alaúde de plátano Milagre é que não se quebre. E a sua fronte arde em febre, — Ai dele! e os cuidados matam-no. Ai dele! que essa alegria, Aquelas canções, aquele Surto não é mais, ai dele! Do que uma imensa ironia. Fazendo à cantiga louca Dolorido contracanto, Por dentro borbulha o pranto Como outra voz de outra boca: IV — "Negaste a pele macia "À minha linda paixão! "E irás entregá-la um dia "Aos feios vermes do chão... "Fiz por ver se te podia "Amolecer — e não pude! "Em vão pela noite fria "Devasto o meu alaúde... "Minha paz, minha alegria, "Minha coragem, roubaste-mas... "E hoje a minh'alma sombria "E como um poço de lástimas..." V Corre após a amada esquiva. Procura o precário ensejo De matar o seu desejo Numa carícia furtiva. E encontrando-o Colombina, Se lhe dá, lesta, à socapa, Em vez de beijo uma tapa, O pobre rosto ilumina-se-lhe!... Ele que estava de rastros, Pula, e tão alto se eleva, Como se fosse na treva Romper a esfera dos astros!...

0
0