Maldito invento dum baronete Que dos cruzados neto não é. É mais terrível que o voltarete, Que a vermelhinha, que o lasquinet. Dá mais partido para o banqueiro Do que a roleta, que o dá copioso, Haver não pode, no mundo inteiro, Jogo mais certo, mais engenhoso. Praga maldita, praga danada, Maior que todas as pragas do Egito. Que esta cidade traz devastada, Triste e delgada, como um palito. Pobre cidade, pacata outrora Que só jogava o burro, a bisca, E mais a víspora; hoje a devora A jogatina, que tudo arrisca. Joga o velho, joga o moço, Joga o menino, a menina, Joga a parda do caroço, Joga a dama papa-fina, Joga o Saco-do-Alferes E o fidalgo Botafogo, Jogam homens e mulheres, Todos jogam; tudo é jogo! Joga-se à luz meridiana, À do gás e da candeia, Joga-se toda a semana Sem receio da cadeia. Joga-se tudo bem descarado, Roleta, solo, truco, manilha, Marimbo, pocker, roleta, dado, E o sete-e-meio e a rapa-pilha. Porém dos jogos, mil e quinhentos, Que nos assolam com seus caprichos, Figura impávida, aos quatro ventos, O pavoroso jogo dos bichos. Se tem virtudes, altas e belas, Dizer bem pode muitos magnatas, Alvins, Ribeiros e Cabanelas, E outros ilustres bicharocratas. Em balde a nossa fina polícia, Que tem às vezes um bom capricho, Emprega força, tino e malícia Não lhe é possível "matar o bicho". In: BILAC, Olavo. Bom humor. Org. Eloy Pontes. Rio de Janeiro: Casa Mandarino, 1940*. p.63-65. (Vida literária