Poemas de Saudade
Seleção de poemas sobre o tema da saudade no mil-frases.com. Veja também poemas de sentimentos Os poemas de saudade são aqueles que expressam a tristeza e a saudade que sentimos quando alguém ou algo é perdido. Eles podem tratar de assuntos como o amor perdido, a morte, a mudança ou a distância. Os poemas de saudade geralmente têm um tom mais melancólico e introspectivo, e podem ser escritos de muitas maneiras diferentes, incluindo verso livre, rima ou formas tradicionais. A saudade é uma emoção que todos nós experimentamos de alguma forma, e os poemas de saudade nos permitem encontrar as palavras e as imagens que precisamos para expressar o que sentimos. Eles também nos ajudam a entender e a processar essas emoções de maneira mais profunda, e podem nos ajudar a encontrar consolo e significado em momentos de tristeza ou dificuldade.
Olavo Bilac
Se por vinte anos, nesta furna escura, Deixei dormir a minha maldição, - Hoje, velha e cansada da amargura, Minh'alma se abrirá como um vulcão. E, em torrentes de cólera e loucura, Sobre a tua cabeça ferverão Vinte anos de silêncio e de tortura, Vinte anos de agonia e solidão... Maldita sejas pelo Ideal perdido! Pelo mal que fizeste sem querer! Pelo amor que morreu sem ter nascido! Pelas horas vividas sem prazer! Pela tristeza do que eu tenho sido! Pelo esplendor do que eu deixei de ser!... Olavo Bilac, in "Poesias"
Florbela Espanca
Saudades Saudades! Sim.. talvez.. e por que não?... Se o sonho foi tão alto e forte Que pensara vê-lo até à morte Deslumbrar-me de luz o coração! Esquecer! Para quê?... Ah, como é vão! Que tudo isso, Amor, nos não importe. Se ele deixou beleza que conforte Deve-nos ser sagrado como o pão. Quantas vezes, Amor, já te esqueci, Para mais doidamente me lembrar Mais decididamente me lembrar de ti! E quem dera que fosse sempre assim: Quanto menos quisesse recordar Mais saudade andasse presa a mim! Florbela Espanca, in "Livro de Sóror Saudade"
Florbela Espanca
Se tu viesses ver-me hoje à tardinha, A essa hora dos mágicos cansaços, Quando a noite de manso se avizinha, E me prendesses toda nos teus braços... Quando me lembra: esse sabor que tinha A tua boca... o eco dos teus passos... O teu riso de fonte... os teus abraços... Os teus beijos... a tua mão na minha... Se tu viesses quando, linda e louca, Traça as linhas dulcíssimas dum beijo E é de seda vermelha e canta e ri E é como um cravo ao sol a minha boca... Quando os olhos se me cerram de desejo... E os meus braços se estendem para ti... Florbela Espanca, in "Charneca em Flor"
Florbela Espanca
Amar! Eu quero amar, amar perdidamente! Amar só por amar: Aqui... além... Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente... Amar! Amar! E não amar ninguém! Recordar? Esquecer? Indiferente!... Prender ou desprender? É mal? É bem? Quem disser que se pode amar alguém Durante a vida inteira é porque mente! Há uma Primavera em cada vida: É preciso cantá-la assim florida, Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar! E se um dia hei de ser pó, cinza e nada Que seja a minha noite uma alvorada, Que me saiba perder... pra me encontrar... Florbela Espanca, in "Charneca em Flor"
Luís Vaz de Camões
Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer; É um não querer mais que bem querer; É solitário andar por entre a gente; É nunca contentar-se de contente; É cuidar que se ganha em se perder; É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos amizade, Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Fernando Pessoa
O amor, quando se revela, Não se sabe revelar. Sabe bem olhar p’ra ela, Mas não lhe sabe falar. Quem quer dizer o que sente Não sabe o que há de dizer. Fala: parece que mente… Cala: parece esquecer… Ah, mas se ela adivinhasse, Se pudesse ouvir o olhar, E se um olhar lhe bastasse P’ra saber que a estão a amar! Mas quem sente muito, cala; Quem quer dizer quanto sente Fica sem alma nem fala, Fica só, inteiramente! Mas se isto puder contar-lhe O que não lhe ouso contar, Já não terei que falar-lhe Porque lhe estou a falar…
Fernando Pessoa
Sou louco e tenho por memória Uma longínqua e infiel lembrança De qualquer dita transitória Que sonhei ter quando criança. Depois, malograda trajetória Do meu destino sem esperança, Perdi, na névoa da noite inglória O saber e o ousar da aliança. Só guardo como um anel pobre Que a todo o herdado só faz rico Um frio perdido que me cobre Como um céu dossel de mendigo, Na curva inútil em que fico Da estrada certa que não sigo.
Florbela Espanca
Tudo é vaidade neste mundo vão... Tudo é tristeza; tudo é pó, é nada! E mal desponta em nós a madrugada, Vem logo a noite encher o coração! Até o amor nos mente, essa canção Que nosso peito ri `a gargalhada, Flor que é nascida e logo desfolhada, Pétalas que se pisam pelo chão!... Beijos d ́amor? Pra quê?!... Tristes vaidades! Sonhos que logo são realidades, Que nos deixam a alma como morta! Só acredita neles quem é louca! Beijos d ́amor que vão de boca em boca, Como pobres que vão de porta em porta!...
Luís Vaz de Camões
Busque Amor novas artes, novo engenho Pera matar-me, e novas esquivanças, Que não pode tirar-me as esperanças, Que mal me tirará o que eu não tenho. Olhai de que esperanças me mantenho! Vede que perigosas seguranças! Que não temo contrastes nem mudanças, Andando em bravo mar, perdido o lenho. Mas, enquanto não pode haver desgosto Onde esperança falta, lá me esconde Amor um mal, que mata e não se vê, Que dias há que na alma me tem posto Um não sei quê, que nasce não sei onde, Vem não sei como e dói não sei porquê.
Luís Vaz de Camões
Alma minha gentil, que te partiste Tão cedo desta vida, descontente, Repousa lá no Céu eternamente E viva eu cá na terra sempre triste. Se lá no assento etéreo, onde subiste, Memória desta vida se consente, Não te esqueças daquele amor ardente Que já nos olhos meus tão puro viste. E se vires que pode merecer-te Algu~a cousa a dor que me ficou Da mágoa, sem remédio, de perder-te, Roga a Deus, que teus anos encurtou, Que tão cedo de cá me leve a ver-te, Quão cedo de meus olhos te levou.
Luís Vaz de Camões
Ah! minha Dinamene! Assim deixaste Quem não deixara nunca de querer-te! Ah! Ninfa minha, já não posso ver-te, Tão asinha esta vida desprezaste! Como já pera sempre te apartaste De quem tão longe estava de perder-te? Puderam estas ondas defender-te Que não visses quem tanto magoaste? Nem falar-te somente a dura Morte Me deixou, que tão cedo o negro manto Em teus olhos deitado consentiste! Oh mar! oh céu! oh minha escura sorte! Que pena sentirei que valha tanto, Que inda tenha por pouco viver triste?
Luís Vaz de Camões
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, Muda-se o ser, muda-se a confiança; Todo o mundo é composto de mudança, Tomando sempre novas qualidades. Continuamente vemos novidades, Diferentes em tudo da esperança; Do mal ficam as mágoas na lembrança, E do bem, se algum houve, as saudades. O tempo cobre o chão de verde manto, Que já coberto foi de neve fria, E em mim converte em choro o doce canto. E, afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto: Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões
Posto me tem Fortuna em tal estado, E tanto a seus pés me tem rendido! Não tenho que perder já, de perdido; Não tenho que mudar já, de mudado. Todo o bem pera mim é acabado; Daqui dou o viver já por vivido; Que, aonde o mal é tão conhecido, Também o viver mais será escusado, Se me basta querer, a morte quero, Que bem outra esperança não convém; E curarei um mal com outro mal. E, pois do bem tão pouco bem espero, Já que o mal este só remédio tem, Não me culpem em querer remédio tal.
Luís Vaz de Camões
Que me quereis, perpétuas saudades? Com que esperança inda me enganais? Que o tempo que se vai não torna mais, E se torna, não tornam as idades. Razão é já, ó anos, que vos vades, Porque estes tão ligeiros que passais, Nem todos pera um gosto são iguais, Nem sempre são conformes as vontades. Aquilo a que já quis é tão mudado, Que quase é outra cousa, porque os dias Têm o primeiro gosto já danado. Esperanças de novas alegrias Não mas deixa a Fortuna e o Tempo errado, Que do contentamento são espias.
Luís Vaz de Camões
O dia em que nasci moura e pereça, Não o queira jamais o tempo dar; Não torne mais ao Mundo, e, se tornar, Eclipse nesse passo o Sol padeça. A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça, Mostre o Mundo sinais de se acabar, Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar, A mãe ao próprio filho não conheça. As pessoas pasmadas, de ignorantes, As lágrimas no rosto, a cor perdida, Cuidem que o mundo já se destruiu. Ó gente temerosa, não te espantes, Que este dia deitou ao Mundo a vida Mais desgraçada que jamais se viu!
Luís Vaz de Camões
Vencido está de amor Meu pensamento O mais que pode ser Vencida a vida, Sujeita a vos servir e Instituída, Oferecendo tudo A vosso intento. Contente deste bem, Louva o momento Outra vez renovar Tão bem perdida; A causa que me guia A tal ferida, Ou hora em que se viu Seu perdimento. Mil vezes desejando Está segura Com essa pretensão Nesta empresa, Tão estranha, tão doce, Honrosa e alta Voltando só por vós Outra ventura, Jurando não seguir Rara firmeza, Sem ser no vosso amor Achado em falta.
Luís Vaz de Camões
Coitado! que em um tempo choro e rio; Espero e temo, quero e aborreço; Juntamente me alegro e entristeço; Du~a cousa confio e desconfio. Voo sem asas; estou cego e guio; E no que valho mais menos mereço. Calo e dou vozes, falo e emudeço, Nada me contradiz, e eu aporfio. Queria, se ser pudesse, o impossível; Queria poder mudar-me e estar quedo; Usar de liberdade e estar cativo; Queria que visto fosse e invisível; Queira desenredar-me e mais me enredo: Tais os extremos em que triste vivo! Camões
Luís Vaz de Camões
"Vejo-a na alma pintada, Quando me pede o desejo O natural que não vejo." Se só no ver puramente Me transformei no que vi, De vista tão excelente Mal poderei ser ausente, Enquanto o não for de mi. Porque a alma namorada A traz tão bem debuxada E a memória tanto voa, Que, se a não vejo em pessoa, "Vejo-a na alma pintada." O desejo, que se estende Ao que menos se concede, Sobre vós pede e pretende, Como o doente que pede O que mais se lhe defende. Eu, que em ausência vos vejo, Tenho piedade e pejo De me ver tão pobre estar, Que então não tenho que dar, "Quando me pede o desejo." Como àquele que cegou É cousa vista e notória, Que a Natureza ordenou Que se lhe dobre em memória O que em vista lhe faltou, Assim a mim, que não rejo Os olhos ao que desejo, Na memória e na firmeza Me concede a Natureza "O natural que não vejo."