Poemas sobre Amor-próprio
Poesia que ressalta a importância do amor e respeito por si mesmo, promovendo a autoestima.
Ricardo Reis
Tirem-me os deuses Em seu arbítrio Superior e urdido às escondidas O Amor, glória e riqueza. Tirem, mas deixem-me, Deixem-me apenas A consciência lúcida e solene Das coisas e dos seres. Pouco me importa Amor ou glória. A riqueza é um metal, a glória é um eco E o amor uma sombra. Mas a concisa Atenção dada Às formas e às maneiras dos objectos Tem abrigo seguro. Seus fundamentos São todo o mundo, Seu amor é o plácido Universo, Sua riqueza a vida. A sua glória É a suprema Certeza da solene e clara posse Das formas dos objectos. O resto passa, E teme a morte. Só nada teme ou sofre a visão clara E inútil do Universo. Essa a si basta, Nada deseja Salvo o orgulho de ver sempre claro Até deixar de ver. 06/06/1915
Ricardo Reis
Tirem-me os deuses Em seu arbítrio Superior e urdido às escondidas O Amor, glória e riqueza. Tirem, mas deixem-me, Deixem-me apenas A consciência lúcida e solene Das coisas e dos seres. Pouco me importa Amor ou glória. A riqueza é um metal, a glória é um eco E o amor uma sombra. Mas a concisa Atenção dada Às formas e às maneiras dos objectos Tem abrigo seguro. Seus fundamentos São todo o mundo, Seu amor é o plácido Universo, Sua riqueza a vida. A sua glória É a suprema Certeza da solene e clara posse Das formas dos objectos. O resto passa, E teme a morte. Só nada teme ou sofre a visão clara E inútil do Universo. Essa a si basta, Nada deseja Salvo o orgulho de ver sempre claro Até deixar de ver. 06/06/1915
Ricardo Reis
Tirem-me os deuses Em seu arbítrio Superior e urdido às escondidas O Amor, glória e riqueza. Tirem, mas deixem-me, Deixem-me apenas A consciência lúcida e solene Das coisas e dos seres. Pouco me importa Amor ou glória. A riqueza é um metal, a glória é um eco E o amor uma sombra. Mas a concisa Atenção dada Às formas e às maneiras dos objectos Tem abrigo seguro. Seus fundamentos São todo o mundo, Seu amor é o plácido Universo, Sua riqueza a vida. A sua glória É a suprema Certeza da solene e clara posse Das formas dos objectos. O resto passa, E teme a morte. Só nada teme ou sofre a visão clara E inútil do Universo. Essa a si basta, Nada deseja Salvo o orgulho de ver sempre claro Até deixar de ver. 06/06/1915
Manuel Bandeira
Mandaste a sombra de um beijo Na brancura de um papel: Tremi de susto e desejo, Beijei chorando o papel. No entanto, deste o teu beijo A um homem que não amavas! Esqueceste o meu desejo Pelo de quem não amavas! Da sombra daquele beijo Que farei, se a tua boca É dessas que sem desejo Podem beijar outra boca?
Ricardo Reis
Tornar-te-ás só quem tu sempre foste. O que te os deuses dão, dão no começo. De uma só vez o Fado Te dá o fado, que é um. A pouco chega pois o esforço posto Na medida da tua força nata – A pouco, se não foste Para mais concebido. Contenta-te com seres quem não podes Deixar de ser. Ainda te fica o vasto Céu p'ra cobrir-te, e a terra, Verde ou seca a seu tempo. O fausto repudio, porque o compram. O amor porque acontece. Comigo fico, talvez não contente. Porém nato e sem erro. Eu não procuro o bem que me negaram. As flores dos jardins herdadas de outros. Como hão-de mais que perfumar de longe Meu desejo de tê-las? Não quero a fama, que comigo a têm Eróstrato e o pretor Ser olhado de todos – que se eu fosse Só belo, me olhariam. 12/05/1921
Ricardo Reis
Não pra mim mas pra ti teço as grinaldas Que de hera e rosas eu na fronte ponho. Para mim tece as tuas Que as minhas eu não vejo. Um para o outro, mancebo, realizemos A beleza improfícua mas bastante De agradar um ao outro Plo prazer dado aos olhos. O resto é o fado que nos vai contando Pelo bater do sangue em nossas frontes A vida até que chegue A hora do barqueiro.
Ricardo Reis
Enquanto eu vir o sol luzir nas folhas E sentir toda a brisa nos cabelos Não quererei mais nada. Que me pode o Destino conceder Melhor que o lapso sensual da vida Entre ignorâncias destas? Sábio deveras o que não procura, Que, procurando, achara o abismo em tudo E a dúvida em si mesmo. Pomos a dúvida onde há rosas. Damos Quase tudo do sentido a entendê-lo E ignoramos, pensantes. Estranha a nós a natureza extensa Campos ondula, flores abre, frutos Cora, e a morte chega. Terei razão, se a alguém razão é dada, Quando me a morte conturbar a mente E já não veja mais Que à razão de saber porque vivemos Nós nem a achamos nem achar se deve, Impropícia e profunda.
Ricardo Reis
Quantos gozam o gozo de gozar Sem que gozem o gozo, e o dividem Entre eles e o verem Os outros que eles gozam. Ah, Lídia, os trajos do gozar omite, Que o gozo é um, se é nosso, nem o damos Aos outros como prémio De verem nosso gozo. Cada um é ele só, e se com outros Goza, dos outros goza, e não para eles. Aprende o que te ensina Teu corpo, teu limite.
Ricardo Reis
Enquanto ao longe os bardos perturbarem Com a dos seus combates longa lista A parca e humilde chama De cada flébil vida, E nem um palmo mais sequer conquistam De riqueza ou de calma em suas almas, Nem são mais do que jogo Da ira (...) dos deuses, Quero, livre de humanas (...) De concordância com o sentir de outros Mais firmemente minha Possuir minha vida.
Ricardo Reis
No momento em que vamos pelos prados E o nosso amor é um terceiro ali, Que usurpa que saibamos Um ao certo do outro, Nesse momento, em que o que vemos mesmo Sem o vermos na própria essência entra Da nossa alma comum — Lídia, nesse momento De tão sentir o amor não sei dizer-to, Antes, se falo, só dos prados falo E põe-se música ao meu Eros connosco invisível.
Ricardo Reis
No momento em que vamos pelos prados E o nosso amor é um terceiro ali, Que usurpa que saibamos Um ao certo do outro, Nesse momento, em que o que vemos mesmo Sem o vermos na própria essência entra Da nossa alma comum — Lídia, nesse momento De tão sentir o amor não sei dizer-to, Antes, se falo, só dos prados falo E põe-se música ao meu Eros connosco invisível.
Álvaro de Campos
ODE MORTAL Tu, Caeiro meu mestre, qualquer que seja o traje Com que vestes agora, distante ou próxima, a essência Da tua alma universal localizada, Do teu corpo divino intelectual... Viste com a tua cegueira perfeita, sobre o não ver... Porque o que viste com os teus dedos mortais e admiráveis Foi a face sensível e não a face física das coisas Foi a realidade, e não o real. Porque a verdade que é tudo é só a verdade que há em tudo, E a verdade que há em tudo é a verdade que o mostra! Ah, sem cansaço antecipado da marcha Nem cadáver velado pelo próprio cadáver na alma Nas noites em que o vento assobie no mundo deserto E a casa onde dorme é um túmulo de tudo, Nem o sentir-se morto impossivelmente sentindo-se cadáver, Nem a consciência de não ter consciência dentro de tábuas e chumbo, Nem nada... Olho o céu de dia, e olho o céu de noite – E este universo esférico e côncavo Vejo-o como um espelho dentro do qual vivamos, Limitado porque é a parte de dentro, Mas com estrelas e sol rasgando o vidro Para fora, para o convexo que é infinito. Gritai de alegria, gritai comigo, gritai, Coisas cheias, sobre-cheias, Que sois minha vida turbilhonante... Eu vou sair da esfera oca Não por uma estrela, mas pela luz de uma estrela... Vou para o espaço real... Que o espaço, cá dentro é espaço que está fechado E só parece infinito por estar fechado muito longe... Muito longe em pensá-lo... A minha mão está já no puxador-luz. Vou abrir com um gesto largo, Com um gesto autêntico e mágico A Porta para o Convexo, A janela para o Informe, A Razão para o maravilhoso definitivo. Vou poder circumnavegar por fora este dentro Que tem as estrelas no fim, vou ter o céu Por baixo do sobrado curvo – Tecto da cave das coisas reais, Da abóbada nocturna da morte e da vida... Vou partir para FORA, Para o Arredor Infinito, Para a circunferência exterior, metafísica, Para a luz por fora da noite, Para a Vida-morte por fora da Morte-Vida. E aí, no Verdadeiro, Tirarei os astros e a vida da algibeira como um presente ao Certo, Lerei a Vida de novo, como uma carta guardada E então, com luz melhor, perceberei a letra e saberei. O cais está cheio de gente a ver-me partir. Mas o cais é à minha volta e eu encho o navio. E o mar é cama, caixão, sepultura... E eu não sei o que sou pois já não estou ali... E eu, que cantei A civilização moderna, aliás igual às antigas, As coisas do meu tempo só porque esse tempo foi meu, As máquinas, os motores, Vou em diagonal a tudo para cima. Passo pelos interstícios de tudo, E como um pó sem ser rompo o invólucro E partirei, globe-trotter do Divino, Quantas vezes, quem sabe?, regressando ao mesmo ponto. (Quem anda de noite que sabe do andar e da noite?), Levarei na sacola o conjunto do visto – O céu de estrelas, e o sol em todos os modos, E todas as estações e as suas milhares de cores, E os campos, e as serras, e as terras que cessam em praias, E o mar para além, e o para além do mar que há além. E de repente se abrirá a Última Porta das coisas E Deus, como um Homem, me aparecerá por fim. E será o Inesperado que eu esperava O Desconhecido que eu conheci sempre – O único que eu sempre conheci, (...) 12/01/1927