II. Carnaval A vida é uma tremenda bebedeira. Eu nunca tiro dela outra impressão. Passo nas ruas, tenho a sensação De um carnaval cheio de cor e poeira... A cada hora tenho a dolorosa Sensação, agradável todavia, De ir aos encontrões trás a alegria Duma plebe farsante e copiosa... Cada momento é um carnaval imenso, Em que ando misturado sem querer. Se penso nisto maça-me viver E eu, que amo a intensidade, acho isto intenso De mais... Balbúrdia que entra pela cabeça Dentro a quem quer parar um só momento Em ver o que é que faz ao pensamento Antes que o ser e a lucidez lhe esqueça... Automóveis, veículos, (...) As ruas cheias, (...) Fitas de cinema correndo sempre E nunca tendo um sentido preciso. Julgo-me bêbado, sinto-me confuso, Cambaleio nas minhas sensações, Sinto uma súbita falta de corrimões No pleno dia da cidade (...) Uma pândega esta existência toda... Que embrulhada se mete por mim dentro E sempre em mim desloca o ciente centro Do meu psiquismo, que anda sempre à roda... E contudo eu estou como ninguém De Amoroso acordo com isto tudo... Não encontro em mim, quando em estudo, Diferença entre mim e isto que tem Esta balbúrdia de carnaval tolo, Esta mistura de europeu e zulu Este batuque tremendo e chulo E elegantemente em desconsolo... Que tipos! Que agradáveis e antipáticos! Como eu sou deles com um nojo a eles! O mesmo tom europeu em nossas peles E o mesmo ar conjuga-nos (...) Tenho às vezes o todo de ser eu Com esta forma de hoje e estas maneiras... Gasto inúteis horas inteiras A descobrir quem sou e nunca deu Resultado a pesquisa... Se há um plano Que eu forme, na vida que talho para mim Antes que eu chegue desse plano ao fim Será estar como antes fora dele. É engano A gente ter confiança em quem tem ser... (...)