(...) "No Brasil, como sabes, qualquer zote Um formado doutor se conceitua; Quem pra trolha nasceu, ou pro rabote Não creias que consulte a sorte sua; Toda a baixa gentalha deste lote Em política ao menos se insinua. O vadio, o pedante, o mentecapto Pra os públicos empregos julga-se apto. "Não é com má tenção qu'isto te digo, Mas sim porqu'ad reum o caso o pede, Tu mesmo terás dito lá contigo Que o pedantismo no Brasil tem sede: Quem tem um Governante por amigo Alcança tudo que deseja, e pede, Não se gradua o mérito e a virtude, Pra escravo, e adulador basta que estude. "Há muito qu'este mal nos assolapa E tem feito o Brasil andar à-toa; Toma um alvar de patriota a capa, E defensor da Pátria se apregoa. Dos patriotas é tão grande o mapa Quanto o dos asnos, qu'ela galardoa; Quem talentos não tem, nem tem ofício Um emprego requer em sacrifício "Era o tempo da nossa Independência Em que certa Família dominava, E, como hoje se faz, por influência D'algum patrono, tudo se alcançava. Do nosso Herói não foi baldada a agência, E como patriota se inculcava Alegando ser Jovem Fluminense, Pôde um lugar obter de Amanuense. (...) "Mas coitado! uma idéia o afligia, Era o seu mau estado monetário; Nada tinha de seu; e ele bem via Que tudo no Brasil era precário. Seu lugar d'um Ministro dependia; Sendo tudo interino e arbitrário, Tudo cair podia num instante, Quanto mais ele, mísero pedante! (. ..) Publicado no livro Episódio da Infernal Comédia ou Da Minha Viagem ao Inferno (1836). In: GRANDES poetas românticos do Brasil. Pref. e notas biogr. Antônio Soares Amora. Org. rev. e notas Frederico José da Silva Ramos. São Paulo: LEP, 194