Alberto Caeiro
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Eu nunca guardei rebanhos

Eu nunca guardei rebanhos

Mil-Frases

há 2 anos
Um poema de Alberto Caeiro

Eu nunca guardei rebanhos, Mas é como se os guardasse. Minha alma é como um pastor, Conhece o vento e o sol E anda pela mão das Estacões A seguir e a olhar. Toda a paz da Natureza sem gente Vem sentar-se a meu lado. Mas eu fico triste como um pôr do Sol Para a nossa imaginação, Quando esfria no fundo da planície E se sente a noite entrada Como uma borboleta pela janela.

Mas a minha tristeza é sossego Porque é natural e justa E é o que deve estar na alma Quando já pensa que existe E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Com um ruído de chocalhos Para além da curva da estrada, Os meus pensamentos são contentes. Só tenho pena de saber que eles são contentes, Porque, se o não soubesse, Em vez de serem contentes e tristes, Seriam alegres e contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos. Ser poeta não é uma ambição minha. É a minha maneira de estar sozinho.

E se desejo às vezes, Por imaginar, ser cordeirinho (Ou ser o rebanho todo Para andar espalhado por toda a encosta A ser muita coisa feliz ao mesmo tempo), É só porque sinto o que escrevo ao pôr do Sol Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz E corre um silêncio pela erva fora.

Quando me sento a escrever versos Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos, Escrevo versos num papel que está no meu pensamento, Sinto um cajado nas mãos

E vejo um recorte de mim No cimo dum outeiro, Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas ideias, Ou olhando para as minhas ideias e vendo o meu rebanho, E sorrindo vagamente como quem não compreende o que se diz E quer fingir que compreende.

Saúdo todos os que me lerem, Tirando-lhes o chapéu largo Quando me vêem à minha porta Mal a diligência levanta no cimo do outeiro. Saúdo-os e desejo-lhes sol E chuva, quando a chuva é precisa, E que as suas casas tenham Ao pé duma janela aberta Uma cadeira predilecta Onde se sentem, lendo os meus versos. E ao lerem os meus versos pensem Que sou qualquer coisa natural — Por exemplo, a árvore antiga À sombra da qual quando crianças Se sentavam com um baque, cansados de brincar, E limpavam o suor da testa quente Com a manga do bibe riscado.


Este poema de Alberto Caeiro retrata a conexão profunda entre o poeta e a natureza, expressando a sua identificação com a simplicidade e a tranquilidade dos rebanhos. Através de uma linguagem simples e imagens vívidas, o poema transmite uma sensação de pa
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