Já sob o largo pálio a tenebrosa Noite as estrelas nítidas e belas Prendera ao seio, como mãe piedosa.
De umas as brancas lúcidas capelas, De outras o manto e as clâmides de linho Viam-se à luz da lua. Estas e aquelas,
Todas no lácteo sideral caminho Dormiam, como bando alvinitente De aves, à sombra, nos frouxéis de um ninho.
Vênus, porém, chorava; ela somente De pé, cismando, o níveo olhar mais níveo Que a prata, abria na amplidão dormente.
Olhava ao longo o célico declívio, Como a buscar alguém que desejava, Qual se deseja alguém que é doce alívio.
Só, no espaço desperta, como a escrava Romana ao pé do leito da senhora Velando à noite, a mísera velava.
Um deus de formas válidas adora; São seus cabelos ouro puro, o peito Veste a armadura de cristal da aurora.
Quando ele sai das púrpuras do leito, O arco na mão, parece de diamantes E rosados rubins seu rosto feito.
Dera por vê-lo agora as cintilantes Lágrimas todas, líquido tesouro, Que lhe tremem às pálpebras brilhantes...
Mas soa de repente um grande coro Pelas cavas abóbadas... E logo Assoma ao longe um capacete de ouro.
O deus ouviu-lhe o suplicante rogo! Ei-lo que vem! seu plaustro os ares corta; Ouve o relincho aos seus corcéis de fogo.
Já do roxo Levante se abre a porta... E ao ver-lhe o vulto e as chamas da armadura, Fria, trêmula, muda e quase morta,
Vênus desmaia na infinita altura.
Publicado no livro Poesias: segunda série. Poema integrante da série Alma Livre, 1898/1901.
In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense