Alberto de Oliveira

Alberto de Oliveira é considerado por seus estudiosos como um poeta que se adaptou perfeitamente aos princípios parnasianos, um dos mestres dessa estética. Formou com Olavo Bilac (1865-1918) e Raimundo Correia (1859-1911) a “tríade parnasiana”. É o primeiro ocupante da cadeira n.8, da Academia Brasileira de Letras, cujo patrono é o poeta árcade Cláudio Manoel da Costa (1729-1789). Em outubro de 1935, ele ingressou no Cenáculo Fluminense de História e Letras, em Niterói. Após seu falecimento, sua valiosa biblioteca foi doada à Academia Brasileira de Letras.

Uma imagem com a seguinte frase I

Embala-me, balanço da mangueira,
Embala-me, que enquanto vou contigo,
Contigo venho, o meu pesar esqueço.
Rompe a luz da manhã rosada e linda,
Tudo desperta. E essa por quem padeço,
Lânguida e preguiçosa,
Entre brancos lençóis repousa ainda.
Embala-me, pendente da mangueira,
Na tensa corda, meu balanço amigo!
Em claro a noite inteira
Passei, pensando nela. Ah! que formosa
Estava ontem à tarde no mirante,
Um livro ao colo, às tranças uma rosa,
E o olhar perdido na amplidão distante!
Pensava... Em quem pensava?
Se fosse em mim... Como formosa estava!
Oh! não pausado e manso,
Mas aos arrancos, estirado voa,
Leva-me, meu balanço!

II

Assim cismando, à toa,
Olhos voltados já para a querida
Visão de Laura, já para o céu claro,
Para o campo e arredores,
A manhã passo. Sobre a serra erguida
Em frente nasce e, coroando-a, brilha
O sol. Loureja o ipê com as áureas flores.
Late nos grotões fundos, indo ao faro
Da caça, ao buzinar dos caçadores,
Da fazenda a matilha.
E no ar que sopra dos capões escuros,
Sente-se, de mistura a essências finas
E ao cheiro das resinas,
Um sabor acre de cajás maduros.

III

Cajás! Não é que lembra à Laura um dia
(Que dia claro! esplende o mato e cheira!)
Chamar-me para em sua companhia
Saboreá-los sob a cajazeira!

— Vamos sós? perguntei-lhe. E a feiticeira:
— Então! tens medo de ir comigo? — E ria.
Compõe as tranças, salta-me ligeira
Ao braço, o braço no meu braço enfia.

— Uma carreira! — Uma carreira! — Aposto!
A um sinal breve dado de partida,
Corremos. Zune o vento em nosso rosto.

Mas eu me deixo atrás ficar, correndo,
Pois mais vale que a aposta da corrida
Ver-lhe as saias a voar, como vou vendo.

Imagem - 00020004

Publicado no livro Poesias: segunda série. Poema integrante da série Alma em Flor, 1900.

In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense)

NOTA: Alma em Flor é composto de 3 cantos. O terceiro tem 17 parte

Alberto de Oliveira

I Embala-me, balanço da mangueira, Embala-me, que enquanto vou contigo, Contigo venho, o meu pesar esqueço. Rompe a luz da manhã rosada e linda, Tudo desperta. E essa por quem padeço, Lânguida e preguiçosa, Entre brancos lençóis repousa ainda. Embala-me, pendente da mangueira, Na tensa corda, meu balanço amigo! Em claro a noite inteira Passei, pensando nela. Ah! que formosa Estava ontem à tarde no mirante, Um livro ao colo, às tranças uma rosa, E o olhar perdido na amplidão distante! Pensava... Em quem pensava? Se fosse em mim... Como formosa estava! Oh! não pausado e manso, Mas aos arrancos, estirado voa, Leva-me, meu balanço! II Assim cismando, à toa, Olhos voltados já para a querida Visão de Laura, já para o céu claro, Para o campo e arredores, A manhã passo. Sobre a serra erguida Em frente nasce e, coroando-a, brilha O sol. Loureja o ipê com as áureas flores. Late nos grotões fundos, indo ao faro Da caça, ao buzinar dos caçadores, Da fazenda a matilha. E no ar que sopra dos capões escuros, Sente-se, de mistura a essências finas E ao cheiro das resinas, Um sabor acre de cajás maduros. III Cajás! Não é que lembra à Laura um dia (Que dia claro! esplende o mato e cheira!) Chamar-me para em sua companhia Saboreá-los sob a cajazeira! — Vamos sós? perguntei-lhe. E a feiticeira: — Então! tens medo de ir comigo? — E ria. Compõe as tranças, salta-me ligeira Ao braço, o braço no meu braço enfia. — Uma carreira! — Uma carreira! — Aposto! A um sinal breve dado de partida, Corremos. Zune o vento em nosso rosto. Mas eu me deixo atrás ficar, correndo, Pois mais vale que a aposta da corrida Ver-lhe as saias a voar, como vou vendo. Imagem - 00020004 Publicado no livro Poesias: segunda série. Poema integrante da série Alma em Flor, 1900. In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense) NOTA: Alma em Flor é composto de 3 cantos. O terceiro tem 17 parte

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Uma imagem com a seguinte frase Ser palmeira! existir num píncaro azulado,
Vendo as nuvens mais perto e as estrelas em bando;
Dar ao sopro do mar o seio perfumado,
Ora os leques abrindo, ora os leques fechando;

Só de meu cimo, só de meu trono, os rumores
Do dia ouvir, nascendo o primeiro arrebol,
E no azul dialogar com o espírito das flores,
Que invisível ascende e vai falar ao sol;

Sentir romper do vale e a meus pés, rumorosa,
Dilatar-se e cantar a alma sonora e quente
Das árvores, que em flor abre a manhã cheirosa
Dos rios, onde luz todo o esplendor do Oriente;

E juntando a essa voz o glorioso murmúrio
De minha fronde e abrindo ao largo espaço os véus,
Ir com ela através do horizonte purpúreo
E penetrar nos céus;

Ser palmeira, depois de homem ter sido! est'alma
Que vibra em mim, sentir que novamente vibra,
E eu a espalmo a tremer nas folhas, palma a palma,
E a distendo, a subir num caule, fibra a fibra;

E à noite, enquanto o luar sobre os meus leques treme,
E estranho sentimento, ou pena ou mágoa ou dó,
Tudo tem e, na sombra, ora ou soluça ou geme,
E, como um pavilhão, velo lá em cima eu só;

Que bom dizer então bem alto ao firmamento
O que outrora jamais — homem — dizer não pude,
Da menor sensação ao máximo tormento
Quanto passa através minha existência rude!

E, esfolhando-me ao vento, indômita e selvagem,
Quando aos arrancos vem bufando o temporal,
— Poeta — bramir então à noturna bafagem
Meu canto triunfal!

E isto que aqui não digo então dizer: que te amo,
Mãe natureza! mas de modo tal que o entendas,
Como entendes a voz do pássaro no ramo
E o eco que têm no oceano as borrascas tremendas;

E pedir que, ou no sol, a cuja luz referves,
Ou no verme do chão ou na flor que sorri,
Mais tarde, em qualquer tempo, a minh'alma conserves,
Para que eternamente eu me lembre de ti!

..........................................

Publicado no livro Versos e rimas: primeira parte (1895).

In: Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.1. (Fluminense

Alberto de Oliveira

Ser palmeira! existir num píncaro azulado, Vendo as nuvens mais perto e as estrelas em bando; Dar ao sopro do mar o seio perfumado, Ora os leques abrindo, ora os leques fechando; Só de meu cimo, só de meu trono, os rumores Do dia ouvir, nascendo o primeiro arrebol, E no azul dialogar com o espírito das flores, Que invisível ascende e vai falar ao sol; Sentir romper do vale e a meus pés, rumorosa, Dilatar-se e cantar a alma sonora e quente Das árvores, que em flor abre a manhã cheirosa Dos rios, onde luz todo o esplendor do Oriente; E juntando a essa voz o glorioso murmúrio De minha fronde e abrindo ao largo espaço os véus, Ir com ela através do horizonte purpúreo E penetrar nos céus; Ser palmeira, depois de homem ter sido! est'alma Que vibra em mim, sentir que novamente vibra, E eu a espalmo a tremer nas folhas, palma a palma, E a distendo, a subir num caule, fibra a fibra; E à noite, enquanto o luar sobre os meus leques treme, E estranho sentimento, ou pena ou mágoa ou dó, Tudo tem e, na sombra, ora ou soluça ou geme, E, como um pavilhão, velo lá em cima eu só; Que bom dizer então bem alto ao firmamento O que outrora jamais — homem — dizer não pude, Da menor sensação ao máximo tormento Quanto passa através minha existência rude! E, esfolhando-me ao vento, indômita e selvagem, Quando aos arrancos vem bufando o temporal, — Poeta — bramir então à noturna bafagem Meu canto triunfal! E isto que aqui não digo então dizer: que te amo, Mãe natureza! mas de modo tal que o entendas, Como entendes a voz do pássaro no ramo E o eco que têm no oceano as borrascas tremendas; E pedir que, ou no sol, a cuja luz referves, Ou no verme do chão ou na flor que sorri, Mais tarde, em qualquer tempo, a minh'alma conserves, Para que eternamente eu me lembre de ti! .......................................... Publicado no livro Versos e rimas: primeira parte (1895). In: Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.1. (Fluminense

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Uma imagem com a seguinte frase Já sob o largo pálio a tenebrosa
Noite as estrelas nítidas e belas
Prendera ao seio, como mãe piedosa.

De umas as brancas lúcidas capelas,
De outras o manto e as clâmides de linho
Viam-se à luz da lua. Estas e aquelas,

Todas no lácteo sideral caminho
Dormiam, como bando alvinitente
De aves, à sombra, nos frouxéis de um ninho.

Vênus, porém, chorava; ela somente
De pé, cismando, o níveo olhar mais níveo
Que a prata, abria na amplidão dormente.

Olhava ao longo o célico declívio,
Como a buscar alguém que desejava,
Qual se deseja alguém que é doce alívio.

Só, no espaço desperta, como a escrava
Romana ao pé do leito da senhora
Velando à noite, a mísera velava.

Um deus de formas válidas adora;
São seus cabelos ouro puro, o peito
Veste a armadura de cristal da aurora.

Quando ele sai das púrpuras do leito,
O arco na mão, parece de diamantes
E rosados rubins seu rosto feito.

Dera por vê-lo agora as cintilantes
Lágrimas todas, líquido tesouro,
Que lhe tremem às pálpebras brilhantes...

Mas soa de repente um grande coro
Pelas cavas abóbadas... E logo
Assoma ao longe um capacete de ouro.

O deus ouviu-lhe o suplicante rogo!
Ei-lo que vem! seu plaustro os ares corta;
Ouve o relincho aos seus corcéis de fogo.

Já do roxo Levante se abre a porta...
E ao ver-lhe o vulto e as chamas da armadura,
Fria, trêmula, muda e quase morta,

Vênus desmaia na infinita altura.

Publicado no livro Poesias: segunda série. Poema integrante da série Alma Livre, 1898/1901.

In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense

Alberto de Oliveira

Já sob o largo pálio a tenebrosa Noite as estrelas nítidas e belas Prendera ao seio, como mãe piedosa. De umas as brancas lúcidas capelas, De outras o manto e as clâmides de linho Viam-se à luz da lua. Estas e aquelas, Todas no lácteo sideral caminho Dormiam, como bando alvinitente De aves, à sombra, nos frouxéis de um ninho. Vênus, porém, chorava; ela somente De pé, cismando, o níveo olhar mais níveo Que a prata, abria na amplidão dormente. Olhava ao longo o célico declívio, Como a buscar alguém que desejava, Qual se deseja alguém que é doce alívio. Só, no espaço desperta, como a escrava Romana ao pé do leito da senhora Velando à noite, a mísera velava. Um deus de formas válidas adora; São seus cabelos ouro puro, o peito Veste a armadura de cristal da aurora. Quando ele sai das púrpuras do leito, O arco na mão, parece de diamantes E rosados rubins seu rosto feito. Dera por vê-lo agora as cintilantes Lágrimas todas, líquido tesouro, Que lhe tremem às pálpebras brilhantes... Mas soa de repente um grande coro Pelas cavas abóbadas... E logo Assoma ao longe um capacete de ouro. O deus ouviu-lhe o suplicante rogo! Ei-lo que vem! seu plaustro os ares corta; Ouve o relincho aos seus corcéis de fogo. Já do roxo Levante se abre a porta... E ao ver-lhe o vulto e as chamas da armadura, Fria, trêmula, muda e quase morta, Vênus desmaia na infinita altura. Publicado no livro Poesias: segunda série. Poema integrante da série Alma Livre, 1898/1901. In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense

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Uma imagem com a seguinte frase — "... Vi um por um, oh! provação tremenda!
Nunca me há de esquecer aquele dia!
Debandar os escravos da fazenda.

A esta, em idos tempos de alegria,
Chamara, porque as tinha, de "Esperança",
"Desengano" melhor lhe chamaria.

Ah! dor nenhuma, como a da lembrança
Da ventura que foi, na desventura
Ferir mais fundo o coração alcança!

Tanta grandeza há pouco! e eis que da altura
Do meu sonho resvalo e me subverto
Chão adentro em rasgada sepultura!

Ergo-me, tonto ainda, olho — o deserto!
Falo — silêncio! movo os braços — nada!
Somente a solidão ao peito aperto.

Minha "Esperança" desesperançada!
Com que ouvidos te ouvi então o rouco
Arrastado mugido da boiada!

Pus-me a chorar, como criança ou louco,
(Esta fraqueza, amigo, não te encubro)
Pus-me a chorar. Naquele mês, em pouco,

A flor do cafezal, filha de Outubro,
Reclamando a colheita, a rir-se agora,
Já mudada se achava em fruto rubro.

Naquele mês a várzea se melhora
Com a estação mais regrada e água da serra;
Ao sol pompeando, todo caule enflora;

Viça o vesco faval, com o humor que encerra;
Os grãos amojam nas espigas de ouro;
Racha com as grossas túberas a terra.

Mas com que mãos colher tanto tesouro?
As mãos Maio as levou, levando o escravo,
Maio agora tornado sestro agouro.

Meu mal, assim pensando, aflito agravo;
Nas terras, nas lavouras em abandono
Em desesperação os olhos cravo.

Depois, a pouco e pouco, um meio sono
Me vem. Olho estas cousas com fastio,
E deixo-as ir, como se vai sem dono

Barco largado na tensão do rio."

Publicado no livro Poesias, 1904/1911: terceira série (1913). Poema integrante da série Natália.

In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense

Alberto de Oliveira

— "... Vi um por um, oh! provação tremenda! Nunca me há de esquecer aquele dia! Debandar os escravos da fazenda. A esta, em idos tempos de alegria, Chamara, porque as tinha, de "Esperança", "Desengano" melhor lhe chamaria. Ah! dor nenhuma, como a da lembrança Da ventura que foi, na desventura Ferir mais fundo o coração alcança! Tanta grandeza há pouco! e eis que da altura Do meu sonho resvalo e me subverto Chão adentro em rasgada sepultura! Ergo-me, tonto ainda, olho — o deserto! Falo — silêncio! movo os braços — nada! Somente a solidão ao peito aperto. Minha "Esperança" desesperançada! Com que ouvidos te ouvi então o rouco Arrastado mugido da boiada! Pus-me a chorar, como criança ou louco, (Esta fraqueza, amigo, não te encubro) Pus-me a chorar. Naquele mês, em pouco, A flor do cafezal, filha de Outubro, Reclamando a colheita, a rir-se agora, Já mudada se achava em fruto rubro. Naquele mês a várzea se melhora Com a estação mais regrada e água da serra; Ao sol pompeando, todo caule enflora; Viça o vesco faval, com o humor que encerra; Os grãos amojam nas espigas de ouro; Racha com as grossas túberas a terra. Mas com que mãos colher tanto tesouro? As mãos Maio as levou, levando o escravo, Maio agora tornado sestro agouro. Meu mal, assim pensando, aflito agravo; Nas terras, nas lavouras em abandono Em desesperação os olhos cravo. Depois, a pouco e pouco, um meio sono Me vem. Olho estas cousas com fastio, E deixo-as ir, como se vai sem dono Barco largado na tensão do rio." Publicado no livro Poesias, 1904/1911: terceira série (1913). Poema integrante da série Natália. In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1978. v.2. (Fluminense

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Uma imagem com a seguinte frase Bate a cancela da estrada
Constantemente.

Cavaleiro, à disparada,
Lá vai no cavalo ardente.
Cavaleiro em descuidada
Marcha, lá vem indolente.

Passa, ondeia levantada
A poeira, toldando o ambiente.

Bate a cancela da estrada
Constantemente.

Bate, e exaspera-se e brada
Ou chora contra o batente:
(Ninguém lhe ouve na arrastada,
Roufenha voz o que sente)

— "Minha vida desgraçada
Repouso não me consente;
Vivo a bater nesta estrada
Constantemente."

Moços, moças, de tornada
De alguma festa, em ridente
Chusma inquieta e alvoroçada,
Passaram ruidosamente.

Desta inda se ouve a risada,
Daquele o beijo... Plangente

Bate a cancela da estrada
Constantemente.

Agora, é noiva coroada
De capela alvinitente;
Segue o noivo a sua amada,
Um carro atrás, outro à frente.

Agora, é uma cruz alçada...
Um enterro. Quanta gente!

Bate a cancela da estrada
Constantemente.

Bate ao vir a madrugada,
Bate, ao ir-se o sol no poente;
(Das sombras pela calada
Seu bater é mais dolente)

Bate, se é noite enluarada,
Se escura é a noite e silente;

Bate a cancela da estrada
Constantemente.

Nossa vida é aquela estrada,
Com os que passam diariamente
E após si da caminhada
A poeira deixam somente.

Coração, como a cansada
Cancela de som gemente,

Bates a tua pancada
Constantemente.

Publicado no livro Poesias, 1912/1925: quarta série (1927). Poema integrante da série Alma e Céu.

In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1979. v.3. (Fluminense

Alberto de Oliveira

Bate a cancela da estrada Constantemente. Cavaleiro, à disparada, Lá vai no cavalo ardente. Cavaleiro em descuidada Marcha, lá vem indolente. Passa, ondeia levantada A poeira, toldando o ambiente. Bate a cancela da estrada Constantemente. Bate, e exaspera-se e brada Ou chora contra o batente: (Ninguém lhe ouve na arrastada, Roufenha voz o que sente) — "Minha vida desgraçada Repouso não me consente; Vivo a bater nesta estrada Constantemente." Moços, moças, de tornada De alguma festa, em ridente Chusma inquieta e alvoroçada, Passaram ruidosamente. Desta inda se ouve a risada, Daquele o beijo... Plangente Bate a cancela da estrada Constantemente. Agora, é noiva coroada De capela alvinitente; Segue o noivo a sua amada, Um carro atrás, outro à frente. Agora, é uma cruz alçada... Um enterro. Quanta gente! Bate a cancela da estrada Constantemente. Bate ao vir a madrugada, Bate, ao ir-se o sol no poente; (Das sombras pela calada Seu bater é mais dolente) Bate, se é noite enluarada, Se escura é a noite e silente; Bate a cancela da estrada Constantemente. Nossa vida é aquela estrada, Com os que passam diariamente E após si da caminhada A poeira deixam somente. Coração, como a cansada Cancela de som gemente, Bates a tua pancada Constantemente. Publicado no livro Poesias, 1912/1925: quarta série (1927). Poema integrante da série Alma e Céu. In: OLIVEIRA, Alberto de. Poesias completas. Ed. crít. Marco Aurélio Mello Reis. Rio de Janeiro: Núcleo Ed. da UERJ, 1979. v.3. (Fluminense

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