Como da copa verde uma folha caída Treme e deriva à flor do arroio fugidio, Deixa-te assim também derivar pela vida, Que é como um largo, ondeante e misterioso rio... Até que te surpreenda a carne dolorida Aquela sensação final de eterno frio, Abre-te à luz do sol que à alegria convida, E enche-te de canções, ó coração vazio! A asa do vento esflora as camélias e as rosas. Toda a paisagem canta. E das moitas cheirosas O aroma dos mirtais sobe nos céus escampos. Vai beber o pleno ar... E enquanto lá repousas, Esquece as mágoas vãs na poesia dos campos E deixa transfundir-te, alma, na alma das cousas... Teresópolis, 1906 À BEIRA D'ÁGUA D'água o fluido lençol, onde em áscuas cintila O sol, que no cristal argênteo se refrata, Crepitando na pedra, a cuja borda oscila, Cai, gemendo e cantando, ao fundo da cascata. Parece a grave queixa, atroando em torno a mata, Contar não sei que mágoa inconsolada, e a ouvi-la A alma se nos escapa e vai perder-se abstrata Na avassalante paz da solidão tranqjúila... Às vezes, a tremer na fraga faiscante, Passa uma folha verde, e sobre a veia ondeante Abandona-se toda, ansiosa pelo mar... E vendo-a mergulhar na espuma que a sacode, Não sei que íntimo e vago anseio ali me acode De cair como a folha e deixar-me levar... Teresópolis, 1906