Poemas para Reflexão
Colectânea de poemas para reflectir e se encontrar. Temo também poemas de sobre a vida que deve consultar. Os poemas para refletir são aqueles que nos convidam a pensar sobre nossas próprias vidas, nossos valores, nossas escolhas e nossas relações. Eles podem ser profundos e introspectivos, ou leves e divertidos, mas sempre nos desafiam a olhar para dentro de nós mesmos e a considerar o que realmente importa. Os poemas para refletir podem tratar de assuntos filosóficos, políticos, sociais ou pessoais, e podem ser escritos de muitas maneiras diferentes, incluindo verso livre, rima ou formas tradicionais. Seja qual for o estilo ou a forma de escrita, os poemas para refletir são uma forma poderosa de nos conectar com nós mesmos e com o mundo ao nosso redor.
Joaquim Maria Machado de Assis
Pensa em ti mesma, acharás Melhor poesia, Viveza, graça, alegria, Doçura e paz. Se já dei flores um dia, Quando rapaz, As que ora dou têm assaz Melancolia. Uma só das horas tuas Valem um mês Das almas já ressequidas. Os sóis e as luas Creio bem que Deus os fez Para outras vidas.
Joaquim Maria Machado de Assis
Je veux changer mes pensées en oiseaux. C. MAROT Olha como, cortando os leves ares, Passam do vale ao monte as andorinhas; Vão pousar na verdura dos palmares, Que, à tarde, cobre transparente véu; Voam também como essas avezinhas Meus sombrios, meus tristes pensamentos; Zombam da fúria dos contrários ventos, Fogem da terra, acercam-se do céu. Porque o céu é também aquela estância Onde respira a doce criatura, Filha do nosso amor, sonho da infância, Pensamento dos dias juvenis. Lá, como esquiva flor, formosa e pura, Vives tu escondida entre a folhagem, Ó rainha do ermo, ó fresca imagem Dos meus sonhos de amor calmo e feliz! Vão para aquela estância enamorados, Os pensamentos de minh'alma ansiosa; Vão contar-lhe os meus dias gozados E estas noites de lágrimas e dor. Na tua fronte pousarão, mimosa, Como as aves no cimo da palmeira, Dizendo aos ecos a canção primeira De um livro escrito pela mão do amor. Dirão também como conservo ainda No fundo de minh'alma essa lembrança De tua imagem vaporosa e linda, Único alento que me prende aqui. E dirão mais que estrelas de esperança Enchem a escuridão das noites minhas. Como sobem ao monte as andorinhas, Meus pensamentos voam para ti. Publicado no livro Falenas: Vária, Lira Chinesa, Uma Ode a Anacreonte, Pálida Elvira (1870). Poema integrante da série Vária. In: ASSIS, Machado de. Obra completa. Org. Afrânio Coutinho. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994 v.3, p.51-52. (Biblioteca luso-brasileira. Série brasileira
Joaquim Maria Machado de Assis
Tu foges à cidade? Feliz amigo! Vão Contigo a liberdade, A vida e o coração. A estância que te espera É feita para o amor Do sol com a primavera, No seio de uma flor. Do paço de verdura Transpõe-me esses umbrais; Contempla a arquitetura Dos verdes palmeirais. Esquece o ardor funesto Da vida cortesã; Mais val que o teu Digesto A rosa da manhã. Rosa . . . que se enamora Do amante colibri, E desde a luz da aurora Os seios lhe abre e ri. Mas Zéfiro brejeiro Opõe ao beija-flor Embargos de terceiro Senhor e possuidor. Quer este possuí-la, Também o outro a quer. A pobre flor vacila, Não sabe a que atender. O sol, juiz tão grave Como o melhor doutor, Condena a brisa e a ave Aos ósculos da flor. Zéfiro ouve e apela. Apela o colibri. No entanto, a flor singela Com ambos folga e ri. Tal a formosa dama Entre dois fogos, quer Aproveitar a chama . . . Rosa, tu és mulher! Respira aqueles ares, Amigo. Deita ao chão Os tédios e os pesares. Revive. O coração É como o passarinho, Que deixa sem cessar A maciez do ninho Pela amplidão do ar. Pudesse eu ir contigo, Gozar contigo a luz; Sorver ao pé do amigo Vida melhor e a flux! Ir escrever nos campos, Nas folhas dos rosais, E à luz dos pirilampos, Ó Flora, os teus jornais! Da estrela que mais brilha Tirar um raio, e então Fazer a gazetilha Da imensa solidão. Vai tu, que podes. Deixa Os que não podem ir, Soltar a inútil queixa. Mudar é reflorir.
Joaquim Maria Machado de Assis
Que a mão do tempo e o hálito dos homens Murchem a flor das ilusões da vida, Musa consoladora, É no teu seio amigo e sossegado Que o poeta respira o suave sono. Não há, não há contigo, Nem dor aguda, nem sombrios ermos; Da tua voz os namorados cantos Enchem, povoam tudo De íntima paz, de vida e de conforto. Ante esta voz que as dores adormece, E muda o agudo espinho em flor cheirosa, Que vales tu, desilusão dos homens? Tu que podes, ó tempo? A alma triste do poeta sobrenada À enchente das angústias, E, afrontando o rugido da tormenta, Passa cantando, alcíone divina. Musa consoladora, Quando da minha fronte de mancebo A última ilusão cair, bem como Folha amarela e seca Que ao chão atira a viração do outono, Ah! no teu seio amigo Acolhe-me, — e haverá minha alma aflita, Em vez de algumas ilusões que teve, A paz, o último bem, último e puro! Publicado no livro Crisálida: poesias (1864). In: ASSIS, Machado de. Obra completa. Org. Afrânio Coutinho. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v.3, p.19. (Biblioteca luso-brasileira. Série brasileira
Joaquim Maria Machado de Assis
Quando, contigo a sós, as mãos unidas, Tu, pensativa e muda, e eu, namorado, Às volúpias do amor a alma entregando, Deixo correr as horas fugidias; Ou quando às solidões de umbrosa selva Comigo te arrebato; ou quando escuto — Tão só eu, — teus terníssimos suspiros; E de meus lábios solto Eternas juras de constância eterna; Ou quando, enfim, tua adorada fronte Nos meus joelhos trêmulos descansa, E eu suspendo meus olhos em teus olhos, Como às folhas da rosa ávida abelha; Ai, quanta vez então dentro em meu peito Vago terror penetra, como um raio! Empalideço, tremo; E no seio da glória em que me exalto, Lágrimas verto que a minha alma assombram! Tu, carinhosa e trêmula, Nos teus braços me cinges, — e assustada, Interrogando em vão, comigo choras! "Que dor secreta o coração te oprime?" Dizes tu. "Vem, confia os teus pesares... "Fala! eu abrandarei as penas tuas! "Fala! eu consolarei tua alma aflita!" Vida do meu viver, não me interrogues! Quando enlaçado nos teus níveos braços A confissão de amor te ouço, e levanto Lânguidos olhos para ver teu rosto, Mais ditoso mortal o céu não cobre! Se eu tremo, é porque nessas esquecidas Afortunadas horas, Não sei que voz do enleio me desperta, E me persegue e lembra Que a ventura coo tempo se esvaece, E o nosso amor é facho que se extingue! De um lance, espavorida, Minha alma voa às sombras do futuro, E eu penso então: "Ventura que se acaba Um sonho vale apenas." Publicado no livro Falenas: Vária, Lira Chinesa, Uma Ode a Anacreonte, Pálida Elvira (1870). Poema integrante da série Vária. In: ASSIS, Machado de. Obra completa. Org. Afrânio Coutinho. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v.3, p.50. (Biblioteca luso-brasileira. Série brasileira) NOTA: Tradução do poema "A El***", de Lamartine, do livro NOUVELLES MÉDITATIONS POÉTIQUES (Novas Meditações Poéticas
Joaquim Maria Machado de Assis
Que a mão do tempo e o hálito dos homens Murchem a flor das ilusões da vida, Musa consoladora, É no teu seio amigo e sossegado Que o poeta respira o suave sono. Não há, não há contigo, Nem dor aguda, nem sombrios ermos; Da tua voz os namorados cantos Enchem, povoam tudo De íntima paz de vida e de conforto. Ante esta voz que as dores adormece, E muda o agudo espinho em flor cheirosa, Que vales tu, desilusão dos homens? Tu que podes, ó tempo? A alma triste do poeta sobrenada À enchente das angústias, E, afrontando o rugido da tormenta, Passa cantando, alcíone divina. Musa consoladora, Quando da minha fronte de mancebo A última ilusão cair, bem como Folha amarela e seca Que ao chão atira a viração do outono, Ah! no teu seio amigo Acolhe-me, - e haverá minha alma aflita, Em vez de algumas ilusões que teve, A paz, o último bem, último e puro! In: Poesias completas. Rio de Janeiro: Livro do Mês, 1959. (Obras completas de Machado de Assis
Manuel Bandeira
Poeta sou; pai, pouco; irmão, mais. Lúcido, sim; eleito, não. E bem triste de tantos ais Que me enchem a imaginação. Com que sonho? Não sei bem não. Talvez com me bastar, feliz — Ah feliz como jamais fui! —, Arrancando do coração — Arrancando pela raiz — Este anseio infinito e vão De possuir o que me possui.
Manuel Bandeira
Ês na minha vida como um luminoso Poema que se lê comovidamente Entre sorrisos e lágrimas de gozo... A cada imagem, outra alma, outro ente Parece entrar em nós e manso enlaçar A velha alma arruinada e doente... — Um poema luminoso como o mar, Aberto em sorrisos de espuma, onde as velas Fogem como garças longínquas no ar...
Manuel Bandeira
Chora de manso e no íntimo... Procura Curtir sem queixa o mal que te crucia: O mundo é sem piedade e até riria Da tua inconsolável amargura. Só a dor enobrece e é grande e é pura. Aprende a amá-la que a amarás um dia. Então ela será tua alegria, E será, ela só, tua ventura... A vida é vã como a sombra que passa... Sofre sereno e de alma sobranceira, Sem um grito sequer, tua desgraça. Encerra em ti tua tristeza inteira. E pede humildemente a Deus que a faça Tua doce e constante companheira...
Manuel Bandeira
O que eu adoro em ti, Não é a tua beleza. A beleza, é em nós que ela existe. A beleza é um conceito. E a beleza é triste. Não é triste em si, Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza. O que eu adoro em ti, Não é a tua inteligência. Não é o teu espírito sutil, Tão ágil, tão luminoso, — Ave solta no céu matinal da montanha. Nem é a tua ciência Do coração dos homens e das coisas. O que eu adoro em ti, Não é a tua graça musical, Sucessiva e renovada a cada momento, Graça aérea como o teu próprio pensamento. Graça que perturba e que satisfaz. O que eu adoro em ti, Não é a mãe que já perdi. Não é a irmã que já perdi. E meu pai. O que eu adoro em tua natureza, Não é o profundo instinto maternal Em teu flanco aberto como uma ferida. Nem a tua pureza. Nem a tua impureza. O que eu adoro em ti — lastima-me e consola-me! O que eu adoro em ti, é a vida. 11 de junho de 1920
Manuel Bandeira
Anunciaram que você morreu. Meus olhos, meus ouvidos testemunham: A alma profunda, não. Por isso não sinto agora a sua falta. Sei bem que ela virá (Pela força persuasiva do tempo). Virá súbito um dia, Inadvertida para os demais. Por exemplo assim: À mesa conversarão de uma coisa e outra. Uma palavra lançada à toa Baterá na franja dos lutos de sangue, Alguém perguntará em que estou pensando, Sorrirei sem dizer que em você Profundamente. Mas agora não sinto a sua falta. (É sempre assim quando o ausente Partiu sem se despedir: Você não se despediu.) Você não morreu: ausentou-se. Direi: Faz tempo que ele não escreve. Irei a São Paulo: você não virá ao meu hotel. Imaginarei: Está na chacrinha de São Roque. Saberei que não, você ausentou-se. Para outra vida? A vida é uma só. A sua continua Na vida que você viveu. Por isso não sinto agora a sua falta.
Manuel Bandeira
Os poucos versos que aí vão, Em lugar de outros é que os ponho. Tu que me lês, deixo ao teu sonho Imaginar como serão. Neles porás tua tristeza Ou bem teu júbilo, e, talvez, Lhes acharás, tu que me lês, Alguma sombra de beleza... Quem os ouviu não os amou. Meus pobres versos comovidos! Por isso fiquem esquecidos Onde o mau vento os atirou.
Manuel Bandeira
Se não a vejo e o espírito a afigura, Cresce este meu desejo de hora em hora... Cuido dizer-lhe o amor que me tortura, O amor que a exalta e a pede e a chama e a implora. Cuido contar-lhe o mal, pedir-lhe a cura... Abrir-lhe o incerto coração que chora, Mostrar-lhe o fundo intacto de ternura, Agora embravecida e mansa agora... E é num arroubo em que a alma desfalece De sonhá-la prendada e casta e clara, Que eu, em minha miséria, absorto a aguardo... Mas ela chega, e toda me parece Tão acima de mim... tão linda e rara... Que hesito, balbucio e me acobardo.