Poemas sobre a Natureza
A natureza se esforça rumo ao equilíbrio, pois é nele que está o de mais belo, profundo e feliz sentimento. Quando tudo parece perdido a natureza tem o dom divino de se adaptar, numa possante flexibilidade e resiliência. Encontre aqui poemas sobre a natureza, tanto o Mar, o sol o vento tudo aqui pode encontrar, pode também ver a nossa secção de poemas para reflexão.
Florbela Espanca
Deixa-me ser a tua amiga, amor; A tua amiga só, já que não queres Que pelo teu amor seja a melhor A mais triste de todas as mulheres. Que só, de ti, me venha mágoa e dor O que me importa, a mim?! O que quiseres É sempre um sonho bom! Seja o que for Bendito sejas tu por mo dizeres! Beija-me as mãos, amor, devagarinho... Como se os dois nascêssemos irmãos, Aves cantando, ao sol, no mesmo ninho... Beija-mas bem!... Que fantasia louca Guardar assim, fechados, nestas mãos, Os beijos que sonhei pra minha boca!...
Florbela Espanca
Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste: "Parece Sexta-feira da Paixão. Sempre a cismar, cismar, d ́olhos no chão, Sempre a pensar na dor que não existe... O que é que tem?! Tão nova e sempre triste! Faça por ́star contente! Pois então?!..." Quando se sofre, o que se diz é vão... Meu coração, tudo, calado ouviste... Os meus males ninguém mos adivinha... A minha dor não fala, anda sozinha... Dissesse ela o que sente! Ai quem me dera!... Os males d ́Anto toda a gente os sabe! Os meus...ninguém... A minha dor não cabe Nos cem milhões de versos que eu fizera!...
Florbela Espanca
Não sei quem és. Já não te vejo bem... E ouço-me dizer (ai, tanta vez!...) Sonho que um outro sonho me desfez? Fantasma de que amor? Sombra de quem? Névoa? Quimera? Fumo? Donde vem?... - Não sei se tu, amor, assim me vês!... Nossos olhos não são nossos, talvez... Assim, tu não és tu! Não és ninguém!... És tudo e não és nada... És a desgraça... És quem nem sequer vejo; és um que passa... És sorriso de Deus que não mereço... És aquele que vive e que morreu... És aquele que é quase um outro eu... És aquele que nem sequer conheço...
Florbela Espanca
Lembro-me o que fui dantes. Quem me dera Não lembrar! Em tardes dolorosas Lembro-me que fui a primavera Que em muros velhos faz nascer as rosas! As minhas mãos outrora carinhosas Pairavam como pombas... Quem soubera Por que tudo passou e foi quimera, E por que os muros velhos não dão rosas! São sempre os que eu recordo que me esquecem... Mas digo para mim: "Não me merecem..." E já não fico tão abandonada! Sinto que valho mais, mais pobrezinha: Que também é orgulho ser sozinha E também é nobreza não ter nada!
Florbela Espanca
Até agora eu não me conhecia, Julgava que era eu e eu não era Aquela que em meus versos descrevera Tão clara como a fonte e como o dia. Mas que eu não era eu não o sabia E, mesmo que o soubesse, o não dissera... Olhos fitos em rútila quimera Andava atrás de mim... E não me via! Andava a procurar-me - pobre louca! - E achei o meu olhar no teu olhar, E a minha boca sobre a tua boca! E esta ânsia de viver, que nada acalma, É a chama da tua alma a esbrasear As apagadas cinzas da minha alma!
Florbela Espanca
Meu amor! Meu amante! Meu amigo! Colhe a hora que passa, hora divina, Bebe-a dentro de mim, bebe-a comigo! Sinto-me alegre e forte! Sou menina! Eu tenho, amor, a cinta esbelta e fina... Pele dourada de alabastro antigo... Frágeis mãos de madona florentina... - Vamos correr e rir por entre o trigo! Há rendas de gramíneas pelos montes... Papoulas rubras nos trigais maduros... Água azulada a cintilar nas fontes... E à volta, amor... tornemos, nas alfombras Dos caminhos selvagens e escuros, Num astro só as nossas duas sombras...
Florbela Espanca
A noite empalidece.Alvorecer... Ouve-se mais o gargalhar da fonte... Sobre a cidade muda, o horizonte É uma orquídea estranha a florescer. Há andorinhas prontas a dizer A missa d ́alva, mal o sol desponte. Gritos de galos soam monte em monte Numa intensa alegria de viver. Passos ao longe...um vulto que se esvai... Em cada sombra Colombina trai... Anda o silêncio em volta a q ́rer falar... E o luar que desmaia, macerado, Lembra, pálido, tonto, esfarrapado, Um Pierrot, todo branco, a soluçar..
Florbela Espanca
Nesse país de lenda, que me encanta, Ficaram meus brocados, que despi, E as jóias que p ́las aias reparti Como outras rosas de Rainha Santa! Tanta opala que eu tinha! Tanta, tanta! Foi por lá que as semeei e que as perdi... Mostrem-me esse País onde eu nasci! Mostrem-me o reino de que eu sou infanta! Ó meu país de sonho e de ansiedade, Não sei se esta quimera que me assombra, É feita de mentira ou de verdade! Quero voltar! Não sei por onde vim... Ah! Não ser mais que a sombra duma sombra Por entre tanta sombra igual a mim!
Florbela Espanca
Amiga... noiva... irmã... o que quiseres! Por ti, todos os céus terão estrelas, Por teu amor, mendiga, hei de merecê-las, Ao beijar a esmola que me deres. Podes amar até outras mulheres! - Hei de compor, sonhar palavras belas, Lindos versos de dor só para elas, Para em lânguidas noites lhes dizeres! Crucificada em mim, sobre os meus braços, Hei de pousar a boca nos teus passos Pra não serem pisados por ninguém. E depois... Ah, depois de dores tamanhas, Nascerás outra vez de outras entranhas, Nascerás outra vez de uma outra mãe!
Florbela Espanca
Na cidade de Assis, Il Poverello Santo, três vezes santo, andou pregando Que o sol, a terra, a flor, o rocio brando, Da pobreza o tristíssimo flagelo, Tudo quanto há de vil, quanto há de belo, Tudo era nosso irmão! - E assim sonhando, Pelas estradas da Umbria foi forjando Da cadeia do amor o maior elo! "Olha o nosso irmão Sol, nossa irmã Água..." Ah! Poverello! Em mim, essa lição Perdeu-se como vela em mar de mágoa Batida por furiosos vendavais! - Eu fui na vida a irmã de um só irmão, E já não sou a irmã de ninguém mais!
Florbela Espanca
Horas mortas... Curvada aos pés do monte A planície é um brasido... e, torturadas, As árvores sangrentas, revoltadas, Gritam a Deus a bênção duma fonte! E quando, manhã alta, o sol posponte A ouro a giesta, a arder, pelas estradas, Esfíngicas, recortam desgrenhadas Os trágicos perfis no horizonte! Árvores! Corações, almas que choram, Almas iguais à minha, almas que imploram Em vão remédio para tanta mágoa! Árvores! Não choreis! Olhai e vede: - Também ando a gritar, morta de sede, Pedindo a Deus a minha gota d ́água!