Poemas sobre Despedidas
Poesia que lida com o sentimento de despedida, a dor da separação e as lembranças que permanecem.
Florbela Espanca
Quem me dera voltar à inocência Das coisas brutas, sãs, inanimadas, Despir o vão orgulho, a incoerência: - Mantos rotos de estátuas mutiladas! Ah! Arrancar às carnes laceradas Seu mísero segredo de consciência! Ah! Poder ser apenas florescência De astros em puras noites deslumbradas! Ser nostálgico choupo ao entardecer, De ramos graves, plácidos, absortos Na mágica tarefa de viver! Ser haste, seiva, ramaria inquieta, Erguer ao sol o coração dos mortos Na urna de ouro de uma flor aberta!...
Florbela Espanca
Dize-me, amor, como te sou querida, Conta-me a glória do teu sonho eleito, Aninha-me a sorrir junto ao teu peito, Arranca-me dos pântanos da vida. Embriagada numa estranha lida, Trago nas mãos o coração desfeito, Mostra-me a luz, ensina-me o preceito Que me salve e levante redimida! Nesta negra cisterna em que me afundo, Sem quimeras, sem crenças, sem turnura, Agonia sem fé dum moribundo, Grito o teu nome numa sede estranha, Como se fosse, amor, toda a frescura Das cristalinas águas da montanha!
Florbela Espanca
Este querer-te bem sem me quereres, Este sofrer por ti constantemente, Andar atrás de ti sem tu me veres Faria piedade a toda a gente. Mesmo a beijar-me a tua boca mente... Quantos sangrentos beijos de mulheres Pousa na minha a tua boca ardente, E quanto engano nos seus vãos dizeres!... Mas que me importa a mim que me não queiras, Se esta pena, esta dor, estas canseiras, Este mísero pungir, árduo e profundo, Do teu frio desamor, dos teus desdéns, É, na vida, o mais alto dos meus bens? É tudo quanto eu tenho neste mundo?
Fernando Pessoa
Quando era jovem, eu a mim dizia: Como passam os dias, dia a dia, E nada conseguido ou intentado! Mais velho, digo, com igual enfado: Como, dia após dia, os dias vão, Sem nada feito e nada na intenção! Assim, naturalmente, envelhecido, Direi, e com igual voz e sentido: Um dia virá o dia em que já não Direi mais nada. Quem nada foi nem é não dirá nada. 1921
Fernando Pessoa
Hoje estou triste, estou triste. Estarei alegre amanhã... O que se sente consiste Sempre em qualquer coisa vã. Ou chuva, ou sol, ou preguiça... Tudo influi, tudo transforma... A alma não tem justiça, A sensação não tem forma. Uma verdade por dia... Um mundo por sensação... Estou triste. A tarde está fria. Amanhã, sol e razão. 22/04/1928
Fernando Pessoa
O amor, quando se revela, Não se sabe revelar. Sabe bem olhar p'ra ela, Mas não lhe sabe falar. Quem quer dizer o que sente Não sabe o que há-de dizer. Fala: parece que mente... Cala: parece esquecer... Ah, mas se ela adivinhasse, Se pudesse ouvir o olhar, E se um olhar lhe bastasse P'ra saber que a estão a amar! Mas quem sente muito, cala; Quem quer dizer quanto sente Fica sem alma nem fala, Fica só, inteiramente! Mas se isto puder contar-lhe O que não lhe ouso contar, Já não terei que falar-lhe Porque lhe estou a falar... 1928
Fernando Pessoa
Quando era jovem, eu a mim dizia: Como passam os dias, dia a dia, E nada conseguido ou intentado! Mais velho, digo, com igual enfado: Como, dia após dia, os dias vão, Sem nada feito e nada na intenção! Assim, naturalmente, envelhecido, Direi, e com igual voz e sentido: Um dia virá o dia em que já não Direi mais nada. Quem nada foi nem é não dirá nada. 1921
Fernando Pessoa
Quando era jovem, eu a mim dizia: Como passam os dias, dia a dia, E nada conseguido ou intentado! Mais velho, digo, com igual enfado: Como, dia após dia, os dias vão, Sem nada feito e nada na intenção! Assim, naturalmente, envelhecido, Direi, e com igual voz e sentido: Um dia virá o dia em que já não Direi mais nada. Quem nada foi nem é não dirá nada. 1921
Fernando Pessoa
Quando era jovem, eu a mim dizia: Como passam os dias, dia a dia, E nada conseguido ou intentado! Mais velho, digo, com igual enfado: Como, dia após dia, os dias vão, Sem nada feito e nada na intenção! Assim, naturalmente, envelhecido, Direi, e com igual voz e sentido: Um dia virá o dia em que já não Direi mais nada. Quem nada foi nem é não dirá nada. 1921
Fernando Pessoa
Deixo ao cego e ao surdo A alma com fronteiras, Que eu quero sentir tudo De todas as maneiras. Do alto de ter consciência Contemplo a terra e o céu Olho-os com inocência... Nada que vejo é meu. Mas vejo tão atento Tão neles me disperso Que cada pensamento Me torna já diverso. E como são estilhaços Do ser, as coisas dispersas Quebro a alma em pedaços E em pessoas diversas. E se a própria alma vejo Com outro olhar, Pergunto se há ensejo De por isto a julgar. Ah, tanto como a terra E o mar e o vasto céu. Quem se crê próprio erra, Sou vário e não sou meu. Se as coisas são estilhaços Do saber do universo, Seja eu os meus pedaços, Impreciso e diverso. Se quanto sinto é alheio E de mim se sente, Como é que a alma veio A acabar-se em ente? Assim eu me acomodo Com o que Deus criou, Deixo teu diverso modo Diversos modos sou. Assim a Deus imito, Que quando fez o que é Tirou-lhe o infinito E a unidade até. 24/08/1930
Fernando Pessoa
Daqui a pouco acaba o dia. Não fiz nada. Também, que coisa é que faria? Fosse o que fosse, estava errada. Daqui a pouco a noite vem. Chega em vão Para quem como eu só tem Para contar o coração. E após a noite a irmos dormir Torna o dia. Nada farei senão sentir. Também que coisa é que faria? 31/08/1930
Fernando Pessoa
Gnomos do luar que faz selvas As florestas sossegadas, Que sois silêncios nas relvas, E em almas abandonadas Fazeis sombras enganadas, Que sempre se a gente olha Acabastes de passar E só um tremor de folha Que o vento pode explicar Fala de vós sem falar, Levai-me no vosso rastro, Que em minha alma quero ser Como vosso corpo, um astro Que só brilha quando houver Quem o suponha sem ver. Ah, sentir tudo de todos os feitios! Não ter alma, não ter Só diversos modos – Seja eu leitura variada Para mim mesmo! Assim eu que canto ou choro Quero velar-me e partir. Lembrando o que não memoro, Alguém me saiba sentir, Mas ninguém me definir. 26/08/1930
Fernando Pessoa
Minha mulher, a solidão, Consegue que eu não seja triste. Ah, que bom é ao coração Ter este bem que não existe! Recolho a não ouvir ninguém, Não sofro o insulto de um carinho E falo alto sem que haja alguém: Nascem-me os versos do caminho. Senhor, se há bem que o céu conceda Submisso à opressão do Fado, Dá-me eu ser só – veste de seda –, E fala só – leque animado. 27/08/1930
Fernando Pessoa
Tão vago é o vento que parece Que as folhas fremem só por vida. Dorme um calar em que se esquece Em que é que o campo nos convida? Não sei. Anónimo de mim, Não posso erguer uma intenção Do saco em que me sinto assim, Caído nesse verde chão. Com a alma feita em animal, A quem o sol é um lombo quente. Aceito como a brisa real A sensação de ser quem sente. E os olhos que me pesam baixo Olham pela alma o campo e a estrada. No chão um fósforo é o que acho. Nas sensações não acho nada. 31/08/1930